Revisão do Plano Diretor: por que estamos diante de uma aberração
A Câmara dos Vereadores aprovou em primeiro turno, no dia 31 de maio, o projeto de revisão do Plano Diretor Estratégico do município de São Paulo. O texto alterou muito a proposta enviada inicialmente pela Prefeitura e inseriu mudanças de grande impacto no Plano Diretor.
Nas próximas semanas, antes da votação em segundo turno, estão previstas sete audiências públicas sobre o tema, todas na Câmara Municipal. Serão oportunidades para pressionar contra as várias alterações que tornam São Paulo uma cidade pior, muito pior. Destacamos abaixo alguns dos pontos que precisam ser revistos com urgência.
A proposta aumenta o número de prédios altos!
Pelo Plano Diretor de 2014, é permitido construir edifícios que tenham quatro vezes a metragem do terreno, em locais próximos a pontos importantes da malha de transportes: num raio de 600 metros de estações de trem e metrô e 300 metros de corredores de ônibus. Pelo projeto em tramitação na Câmara, o raio aumentaria para até 1 quilômetro das estações de metrô e trem e até 450 metros nos corredores de ônibus.
Comentário: A mudança não se aplica a zonas exclusivamente residenciais (ZERs) nem a corredores de serviço (ZCor 1, ZCor 2, ZCor 3), como é boa parte de Alto dos Pinheiros. Mas pode afetar bastante as ruas do nosso entorno. Seria um estímulo para uma maior verticalização, com todos os impactos que conhecemos: trânsito pior, estrangulamento da infraestrutura, mais poluição sonora, mais poluição veicular. Ou seja, iria piorar o que já é muito ruim. Mas não é só isso. A proposta é ruim para o município: desestimula a construção de prédios mais altos em regiões menos cobiçadas (mesmo estando próximas a eixos de transporte) e acentua o impacto em regiões já muito povoadas, como Pinheiros.
Mais construções sem limites – e sem fiscalização
A altura das construções na cidade tem um limite, que varia de área para área. Em alguns casos, é possível construir acima do limite, mediante o pagamento de uma taxa – a outorga onerosa. O projeto aprovado na Câmara permite que, em vez de pagar em dinheiro, as empresas paguem em obras (de mobilidade, habitação ou drenagem).
Comentário: Ao contrário de dinheiro, obras não são uma contrapartida objetiva. Elas podem ter custos muito variáveis, de acordo com o projeto, a qualidade de mão de obra e dos produtos usados. Será difícil fiscalizar se o valor devido foi mesmo bem aplicado. E, com fiscalização mais difícil, a chance de aparecer serviço malfeito aumenta bastante.
Áreas de concessão: a cidade entregue ao deus-dará
O substitutivo aprovado pelos vereadores cria as Zonas de Concessão. São áreas que, por abrigarem ou virem a abrigar atividades concedidas (parques, cemitérios, mercados…), teriam regras especiais, diferentes das previstas para seu entorno. O uso dessas áreas poderia ser alterado.
Comentário: A definição dessas áreas é extremamente vaga. Abre brechas para que o uso seja completamente alterado: pode permitir tipos de comércio proibido no entorno ou edifícios mais altos que os da região onde a área está situada. Abre brechas até para que as próprias empresas determinem o que podem ou não fazer dentro desses espaços. Essa parte do texto precisa ser eliminada.
Praças privadas, mas sem controle
A revisão do Plano Diretor introduz o modelo de praça urbana privada e praça urbana esportiva. Trata-se de um espaço que poderia ser criado em terrenos particulares, em troca de benefícios como redução do IPTU. O local teria entrada livre e não seria cercado, mas poderia ter controle de acesso (apenas entre 0h e 6h!). A conservação e a limpeza ficariam a cargo do proprietário, que poderia instalar pontos de comércio (desde que respeitados os espaços para área verde).
Comentário: A viabilidade provavelmente vai depender dos benefícios fiscais a serem concedidos – o projeto deixa para uma eventual lei específica detalhar como isso funcionaria. A proposta cria uma confusão sobre o controle desses locais: não podem ser fechados, mas a entrada pode ser controlada durante a madrugada… Como controlar o acesso sem cercar o espaço?
Mais parques – mas com que dinheiro?
O projeto cria um Fundo Municipal de Parques, cujos recursos seriam usados na “aquisição de áreas, implantação, operação e gestão dos parques”. Na região da Subprefeitura de Pinheiros, isso incluiria Córrego das Corujas (Alto de Pinheiros), Mário Pimenta Camargo (Itaim Bibi), Mário Covas (Jardim Paulista), Siqueira Campos (Jardim Paulista) e Córrego Verde (em Pinheiros, ainda não existente).
Comentário: Iniciativa positiva. Porém, há ressalvas. O conselho gestor do fundo seria formado por representantes do poder público e da sociedade, mas todos indicados pelo prefeito. O ideal seria mudar, para aumentar a representatividade. Além disso, o modelo não está claro. Hoje, a Prefeitura tem pouca verba para cuidar dos parques – de onde viria o dinheiro para arcar com um número significativamente maior de áreas verdes?